domingo, 24 de outubro de 2010

O espaço

O vento passa pela janela esvoaça as cortinas claras e rendadas. Exatamente enquanto o moço alto, esguio, com uma boina posta na cabeça segue a rua cumprida bordada de árvores. Parece como se o vento o levasse e guiasse sem direção exata. O chá sobre a mesa esfriando. Mas tem cheiro de café também seguindo e circulando a casa oriunda; O papel amassado ao lado do chá; foi ele que causou o silêncio intenso na casa. A casa ao lado nada se ouvia. O vento continuava a circular, a girar. Rodando e rodando como se botasse do seu ar o distinto silêncio camuflado naquilo que desorganizado pode vir.
Exatamente enquanto flores roxas e amarelas são regadas no jardim da casa da frente pelo Sr, e avô Batista, uma mulherzinha com saltos finos, cabelos alisados e roupas de cores em tamanha concordância passa com o desespero e com lágrimas nos olhos. Segue também em direção ao vento. A mesma direção que o rapaz esguio e de boina segue. A aranha no telhado da casa mil seiscentos e vinte e sete, para de trabalhar sobre sua teia ao sentir os passos fortes e barulhentos dos saltos da moça. O vento passa, indica; Sacode todas as folhas da árvore seca que dá no fim da rua. O vento arrepia o corpo da criança que vê o avião passando. A bola de futebol no canto da garagem observa as plantas no vaso ao lado direito, que remirem água.
Enquanto todo esse movimento acontece, ela não volta para tomar o café.
O vento com sua força e significância, leva o papel amassado ao chão de madeira. Há marcas de sapatos ali sobre o chão. São marcas firmes e largas também. Era uma certeza: ele esteve ali, e o que indica o papel amassado, pela última vez.
O avião já passou; A criança levou seu olhar até onde pôde para ver que rumo ia-se dar. E chegava a conclusão de que ia dar no fim do mundo – lá no fim e mais alto fim do mundo. E lá no sentido sul fim do mundo, era justamente a direção que o moço de boina ia. A força dos sentimentos. O vento parecia rir como se tudo lhe pertencesse. Ninguém se queixava. Mesmo quando não havia vento, ninguém se queixava além dela. E se tivessem posto a carta na porta de entrada da casa, talvez o cheiro do café não estivesse presente, e talvez, o chá não esfriaria por que não haveria o porquê de fazê-lo. E talvez, o esvoaçar das cortinas fossem diferentes, e talvez, a aranha nem se quer teria o trabalho de parar o seu belo rendado no canto da casa. Se soubesse o que ia acontecer lá fora, Sr Batista deixaria suas belas flores murcharem com sua natureza. Leva-me contigo, era o que ela pensava e derramava em forma de lágrimas. Como se pudesse, arrependida do seu passado, só conseguia se ver no futuro, com seu amor. Sem ele, o mundo era destrutivo, maldoso e nada serviria para nada. Estava cega. Cega e sozinha. A adolescente na janela aberta de teu quarto obscuro procurava um sentido. Sentiu-se infeliz ao ver a mulherzinha tão arrumadinha passando pela calçada abaixo. Ora, ora, é tempo de rezar, agradecer a Ele de alguma forma. Mas todos só sabiam existir. Ué, e não é só isso – Existir apenas, e basta. Mas a menina adolescente era sozinha demais para existir; isso era o que pensava. E ia a mulherzinha, seguindo. Ela andava como se a rua estivesse cheio da gente e multidão, e somente manter o olhar para baixo sabia, estava também vazia.
Estará curada quando acordar amanhã. Seu consolo era cada passo que dava. O moço de boina estava metido no sonho que não era teu. Sentiu o vento arrepiar os pêlos de teu corpo. Estava cego, deixou a carta sobre a mesa, ao lado da xícara de chá enquanto seu amor passava o café. Não teve coragem de olhar aos olhos dela; Deixou o oficio em rasura, onde apenas dizia: “Preciso de sonhar sozinho”, foi a partir daí que seguiu o vento sem direção. Ela quando menos via, mais cega ficou. Entrou na sala, não o viu, olhou a xícara de chá cheia como havia deixado, observou o papel dobrado em carta, a porta da sala aberta. Se quiseres, digo o que penso; mas ela fez diferente. Amassou o sem abrir. Saiu em desesperos, e em lágrimas. O vento indicou o caminho. Estará curada amanhã; mas ainda estava no hoje, e sabia que ele havia partido.
Por que não conseguimos conhecer razão de primeira vista. Ela abria e fechava os olhos cheios de água, quando finalmente consegui olhar mais adiante e para sua frente. Lá ia ele, seu amor, com sua tradicional boina e esguio, atravessando a rua principal acima, onde dessa rua, dava para ver o trem que seguia ao extremo norte, e de lá se toma um ônibus – a única linha da cidade para chegar à outra cidade, três horas e meia depois estaria lá, na cidade que cresceu. Ele provavelmente chegaria com a própria roupa do corpo, abraçaria seu avô que com tanto cuidado cultivou a terra daquela fazenda, e a primeira coisa que perguntaria ao avô seria, “Onde estão os cavalos?”. Correria para o pasto, e teu sorriso se abriria como um amor a primeira vista, ao montar e cavalgar com o cavalo. Viveria o teu sonho a partir dali. Ela criou coragem, logo, logo a vida se normalizaria. Penso que estamos cegos. Mas mesmo ainda cega, respirou do ar, o acompanhou com o olhar até o fim da rua. E no fim da rua que deu, acabou. O vento indicava, dava movimento, mas só depois de estar no caminho errado, percebe-se qual é na verdade o caminho certo. Estará curada quando acordar de manhã.