segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Trecho

Lembro-me com fervor de teu primeiro olhar ao meu. Parecia como uma luta discreta de poder e desejo. E se isso for desejo, posso bem dizer que agora sei bem o que é desejo. Mas antes de encontrar meus olhos aos teus, passavam-se pessoas ao meu lado esquerdo; Enquanto ia lendo algum livro de Lispector e ouvindo alguma música para distrair, as pessoas se acomodavam em seus lugares naquele ônibus de uma viagem nada “comum” e você chegara. A primeira coisa que avistei à minha esquerda fora tua bolsa bege e transversal. Acompanhei-o até onde pude com meus olhos, e você para bem frente a mim. Boquiaberta observava-o: usava sapatos de couro preto, jeans casual, e uma camisa branca com claras linhas azuis. Foi bem assim que te olhei: De baixo para cima. Até chegar ao teu rosto. E quando cheguei a teu rosto, fixei meu olhar ali, nos teus olhos claros, quase azuis, mas depois descobri que eram verdes. E ali, no encontro de teu olhar, fiquei parada, paralítica, semi-paralítica. Olhava como se já me pertencesse, como se eu já o conhecia. Observei calmamente teus lábios, teu nariz, tua face e todo o conjunto. E logo num encanto, você me olhava, parecia que ali mesmo você me sentia que tomava minha alma. Acho que me entreguei logo ali, quando minha atenção estava a ti, eu que nem escutava mais a música que soava aos meus ouvidos. Eu, que desatenta, deixo o livro que era minha atenção posto ao meu colo, quase que escorregando de meus dedos, e ali, eu sei bem e assumo, foi a partir dali que já era tua.